Currículo, uma prática social



Sendo o currículo uma prática social, podemos dizer que no projeto dos índios Kuikuro o currículo se desenvolve desde a concepção do projeto e roteiro, quando foi necessário repensar sobre a cultura e vida dos indígenas.
Em seguida, o currículo se expande e integra o processo de reconstrução e registro da história, contexto e cultura do povo indígena com o uso de instrumentos culturais produzidos pela sociedade globalizada. Esses instrumentos também fazem parte do currículo e estruturam os modos de representação e atribuição de significados dos conteúdos registrados.
Para chegar à produção do vídeo, foi concebido um projeto e especificado um roteiro, porém, ao comparar o resultado alcançado com a proposta inicial, percebe-se que durante a trajetória da produção ocorreu um processo de transformação.
O uso de tecnologias para produzir o vídeo e, simultaneamente, registrar o processo desenvolvido ao longo do projeto permite identificar quais conhecimentos mobilizados na ação foram previstos e quais conhecimentos emergiram no andamento da ação sem que fossem previstos a priori.
Assim, as tecnologias ajudam a registrar processos e produtos envolvidos em um projeto e explicitam os conhecimentos trabalhados, isto é, o currículo vivido.
Compreender este contexto de um projeto sociocultural com o uso de tecnologias, cuja trajetória delineia um currículo informal desenvolvido fora do âmbito escolar, permite alargar nossa visão para entendermos o currículo em situação de educação formal.
Muitas vezes o currículo é percebido como um documento que organiza um plano de trabalho educativo com os conteúdos, métodos, estratégias e tempos para as atividades de disciplinas ou áreas de conhecimento, constituindo-se como um conjunto de prescrições que serão dinamizadas na prática pedagógica, o que se assemelha ao roteiro elaborado para a produção de um vídeo.
Também na situação escolar, as estruturas curriculares instituídas a priori nas “grades curriculares” se atualizam e alteram no momento do ato pedagógico, transformando o currículo prescrito, que é reconstruído em função das significações atribuídas no contexto da prática socioeducativa.
O currículo construído na ação, isto é, o vivido na prática concreta, pode ser identificado por meio da exploração das características interativas e de registro das TIC, as quais propiciam: 
·                     Acompanhar e recuperar as trajetórias delineadas no desenvolvimento de projetos;
·                     Reconhecer as narrativas curriculares individuais que expressam as inter-relações entre informações e conhecimentos com o uso de diferentes mídias e linguagens, os significados atribuídos em ato; 
·                     Identificar os conhecimentos mobilizados na ação, que se referem tanto aos conhecimentos historicamente produzidos e organizados em materiais didáticos, como aos novos conhecimentos construídos pelos alunos. 

Vocês já identificaram que o uso de tecnologias na prática pedagógica impulsiona a abertura do currículo para incorporar as experiências dos alunos, seu contexto de vida e o que ocorre no mundo?

Ao utilizar as TIC em atividades curriculares, vislumbramos as possibilidades de abertura de espaços, tempos e conhecimentos tradicionalmente trabalhados na escola; de estabelecer conexões entre a escola, o cotidiano da vida dos alunos e os acontecimentos do mundo; de integrar o local com o global; de abrir as fronteiras para o diálogo e o trabalho integrado entre as disciplinas escolares.
A integração de tecnologias ao desenvolvimento do currículo na escola e na sala de aula desperta a consciência sobre as tensões entre a organização curricular fechada em disciplinas estanques com conteúdos previamente selecionados e o currículo integrado e aberto às experiências de vida.
A integração significativa das disciplinas e conhecimentos pode propiciar o envolvimento de alunos e professores em atividades socialmente relevantes, auxiliando na interpretação dos fenômenos socioculturais da comunidade, bem como no resgate da ética, das artes, da diversidade e dos valores a serem vividos pela escola por meio de uma atuação prática e tangível.
As orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN e os Temas Transversais mostram que a escola tem a tarefa de preparar o aluno para a vida e, para isto, ela precisa ser dotada de competência técnica, ética e social para formar o aluno cidadão crítico e com condições de interagir no meio em que vive. Por isso, o currículo precisa ter relação entre os compromissos pedagógicos e sociais, favorecendo a formação integral do ser humano.
Os temas transversais permitem recontextualizar por meio de atividades os saberes sistematizados e outros trazidos pelos alunos, permitindo com isso desenvolver uma educação aberta, integradora, transformadora e significativa, como espaço de produção de conhecimento entre alunos e professores.
O trabalho por projeto usando os recursos da tecnologia na perspectiva de temas transversais pode contribuir para o desenvolvimento tanto dos conteúdos disciplinares como de uma nova maneira de ser e estar frente à nossa realidade: atitude, comprometimento, engajamento, diversidade de leituras etc.
Para conhecer algumas atividades desenvolvidas na perspectiva do Tema Transversal – Meio Ambiente, usando vários recursos do computador, veja o livro O computador em sala de aula: articulando saberes, das professoras Fernanda M. P.Freire e Maria Elisabette B. B. Prado. 
É importante ficar claro de que esta forma aberta de conceber o currículo não ser trata em momento algum de propor o abandono do universo de conhecimentos acumulados ao longo do desenvolvimento da humanidade!
A ideia é reconstruir a concepção de escola como espaço de diálogo e de criação de redes colaborativas com o uso de diferentes linguagens de expressão do pensamento que propiciam a interação entre distintas culturas, escolas, contextos, pessoas e objetos de conhecimento, mobilizam pensamentos criativos, novas aprendizagens e busca conjunta de solução para os problemas da humanidade.
Trata-se de conceber a escola “como memória da humanidade, como sistema de construção do saber, de enriquecimento moral e social, um espaço em que se considere cada aluno como um ser humano à procura de si próprio, em reflexão conjunta com os demais e com o mundo que o rodeia” (SILVA, 2001, p. 846).
Para saber mais sobre o tema Tecnologia e Currículo, leia o texto Tecnologia Educativa e Currículo:caminhos que se cruzam ou se bifurcam?, da professora Clara Pereira Coutinho, do Instituto de Educação e Psicologia da Universidade de Braga, Portugal.

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